Não gosto dessa palavra, personalidade. Acho que ela é usada indevidamente. "Aquela mulher tem personalidade". É óbvio que tem, tanto quanto tem ossos. Não existe pessoa sem personalidade. Existem pessoas que não deixa marcas, que passam por nossas vidas de forma quase despercebida. Que não deixam de si e não levam de nós. Como paredes, sofás, estão ali. Mas não dá vontade de mergulhar nelas. Gosto daqueles cuja intenção principal não é a de agradar, mas que acabam fazendo isso ao despertar em mim a vontade por respostas, o desejo de decifrar os enigmas. Gosto de pessoas que me surpreendem, que me instigam. Doces, ácidas, mas que tenham sabor. De olhos calmos ou furiosos, mas que neles eu possa ver a alma. Que usam da paixão para pensar, para sentir, para agir e interagir. Para viver. Que não estão aqui para fazer número. Que buscam entender, a si mesmos e aos outros. Que se expõem, que saem dos seus mundinhos de verdades perfeitas e felicidade infinita. Gosto das pessoas que são ao mesmo tempo constantes e imprevisíveis. Das que riem e choram nas horas mais impróprias. Das que perderam o medo de dizer "eu te amo" e "eu te odeio". Que desabam de vez em quando. Que pedem desculpas, que agradecem, que imploram por alguma coisa. Das que me fazem rir ou chorar, ou me sentir leve, ou me sentir incomodada. Gosto das pessoas que pensam em coisas absurdas, que sabem ler entrelinhas, que enxergam o invisível. Que fazem poesia das coisas comuns, sem perceber isso. Odeio quem vive de teorias emprestadas. Que sequer entende o que fala, mas repete. Odeio quem nunca questiona as regras. Quem nunca muda o itinerário, quem nunca muda de ideia, quem nunca muda. Ser sempre o mesmo, em uma vida que muda a cada dia? Odeio quem tem medo de odiar. Não concordar é prova de amor, de interesse. Prefiro que gritem comigo do que me ignorem. Os teimosos têm a força da convicção. Os tristes têm sensibilidade. Os inconformados movem o mundo. Os que atrevem-se a pensar e a agir da forma que poucos pensaram e agiram, mudam a história, devagar, abrindo o caminho para aqueles que não coneguem deixar de seguir e acreditar no normal, no evidente, no esperado, no certo, no comum. Ter personalidade é ter coragem para mostrar tudo o que somos, o que gostamos e o que buscamos. Somos formados por aquilo que nos permitimos ser.
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